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Iluminação, ganhar o que já está ganho! Por Miguel Homem

Iluminação, ganhar o que já está ganho!
Miguel Homem

Os quatro objectivos fundamentais que o ser humano persegue são:
1. Artha - segurança, riqueza.
2. Káma - prazer, desejo.
3. Dharma - consciência do que é adequado; como devo agir em busca de artha e káma. Quando ajo inadequadamente, a minha acção representa adharma.
4. Moksha - libertação.

Os primeiros dois objectivos são partilhados com os restantes animais não humanos. Dharma e Moksha são perseguidos apenas pelos seres humanos. De acordo com esta classificação, moksha é o objectivo do ser humano que deseja ser livre da busca daqueles três primeiros objectivos, que pretende acabar com a sensação de que "falta alguma coisa". Esse ser humano busca a libertar-se da sensação de vazio, de ser incompleto, de querer ser algo diferente. O facto de nos depararmos recorrentemente com aquelas sensações demonstra que não pode ser essa a nossa natureza. Se essa fosse a nossa natureza não nos suscitaria desconforto e infelicidade. O leão não é insatisfeito ou infeliz porque mata a gazela. É essa a sua natureza.

Esse desejo de ser completo não é um desejo condicionado. Não é algo que o ser humano construa ao longo da vida. Pelo contrário, é algo natural, inato. Tão natural como a sede ou a fome, portanto é algo cuja busca não pode ser abandonada.
Por outro lado, ao longo da nossa vida vamos experimentando momentos em que nos sentimos completos. Nesses momentos, ainda que por segundos fugazes, a busca cessa. Apenas somos. Somos completos e somos felizes. Sentimo-nos bem com essa experiência e ela mostra-nos que ela existe.

A iluminação é o reconhecimento de um facto que liberta imediatamente da busca. É o reconhecimento de que já se é completo, fonte de toda a paz e felicidade. Moksha não é conquistar nada mas conhecer aquilo que já somos, que sempre fomos, e o meio para isso é auto-conhecimento.

A pessoa madura e inteligente percebe que a busca do ser completo não se consegue através de artha ou káma. Da mesma forma como percebe também que é desnecessário abandonar esses objectivos para ganhar moksha. Por um lado, sempre que conseguimos tornar-nos algo diferente perdemos, necessariamente, o estado anterior. Ou seja, toda a conquista de artha e káma envolve um ganho, mas também uma perda. Por outro lado, a conquista de artha e káma implica sempre uma acção - karma. Ora, a acção tem sempre um âmbito limitado no espaço e no tempo. O resultado de uma acção limitada é também limitado. Percebemos que artha e káma não nos podem trazer o todo, a adequação, o estar completo sempre. O sentido de ser incompleto, de ser inadequado, não depende da presença ou ausência de objectos. Depende, apenas, do reconhecimento do que somos.

O ganho do que ainda não foi conseguido e do que já foi conseguido

Apráptasya prápti é a aquisição daquilo que não foi ainda adquirido e que o é através da acção - karmaná - (ná = através). O segundo tipo de ganho é o ganho daquilo que já foi conseguido, práptasya prápti. É apenas o reconhecimento de algo que já é nosso. O ganho está, por isso, em reconhecer. Antes do reconhecimento não sabemos que o ganho já existe. No momento em que o reconhecemos é como se o tivéssemos conseguido nesse momento, quando na verdade ele já era nosso. O ganho do que já foi conseguido existe quando a ignorância nos impede de conhecer o facto de que o conseguido já existia. Se a causa de não saber o que já se tem é a ignorância, a solução é o oposto, logo, o conhecimento.

Os três primeiros objectivos humanos, artha, káma e dharma estão relacionados com ganhos ainda não atingidos. Ganhos distantes daquele que os busca pelo tempo e pelo espaço e quem tem de ser conquistados pelo esforço. Esforço esse que, pela sua natureza sempre limitada, produz também resultados limitados.

Moksha é o exemplo da realização de algo que já foi, já está conquistado - práptasya prápti. O que significa que para ser reconhecido apenas requer o conhecimento certo que remova a ignorância - avidyá. Moksha está apenas separada de mim por avidyá. Consciente disto, o meu objectivo passa a ser a destruição da ignorância e procuro o conhecimento certo - Brahmavidyá.

Enquanto não nos apercebermos disto tomaremos mokshha da mesma forma que os restantes objectivos mundanos que perseguimos, ou seja, como algo que vamos conquistar depois, já a seguir, logo ao voltar da esquina, mas nunca agora. Trazemos para a busca da libertação o mesmo padrão que nos faz querer essa libertação. O padrão de querermos ser algo diferente, de nos queremos tornar nalguma coisa, como ensina o Swami Dayananda, "the process of becoming". A existência de uma procura demonstra que consideramos não estar na presença do que procuramos. A existência de um buscador nega a existência do que é buscado no presente. O paradoxo é que quando aquilo que busco sou eu e eu sou o buscador, estou a negar a existência daquilo que procuro exactamente onde existe, em mim. O simples facto de me considerar um buscador significa que eu concluí que o que procuro não está na minha presença. Neste sentido, a minha busca só me afasta do que procuro.

Se o que quero é algo que não acabe, isso não pode ser segurança ou prazer, porque tudo o que é produzido é limitado, uma vez que possui início e fim. Então o que procuro tem de ser absoluto, livre de limitações de tempo e espaço. O que procuro é o Absoluto (Brahman) e porque é absoluto não pode ser produzido, já existe agora, e por isso tem que ser áptasya (aquisição do já existente).

Acesse o site: www.dharmabindu.com

 

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